Mais de 6,2 milhões de famílias vivem em residências inadequadas ou não têm moradia no Brasil. A atualização do déficit habitacional, com dados de 2022, foi divulgada pela Câmara Brasileira da Indústria da Construção (CBIC), nesta quarta-feira (3), em coletiva de imprensa realizada em São Paulo. De acordo com a entidade, seriam necessários R$ 961 bilhões de investimento para solucionar a carência de domicílios no país.
O déficit registrado em 2022 teve aumento de 5% em relação a 2019, quando chegou a 5,8 milhões de domicílios, segundo dados da Fundação João Pinheiro. Para os próximos 10 anos, o estudo da CBIC mostrou que a demanda por novas habitações deve chegar a mais 6,5 milhões de novas moradias.
“A sociedade brasileira convive há muitos anos com carência de habitação, saneamento, estrada. Precisamos aproveitar o movimento de programas como o PAC, Minha Casa, Minha Vida, Nova Indústria Brasil para avançarmos e resolvermos esses gargalos sociais. Quando se investe em construção há o retorno econômico, com aumento de arrecadação, do PIB, geração de empregos. Mas há também o retorno social, com a dignidade e cidadania das famílias”, apontou o presidente da CBIC, Renato Correia.
O levantamento mostrou que cerca de 75% do déficit atual, quase cinco milhões de moradias, estão concentrados na faixa 1 do Minha Casa, Minha Vida (MCMV), que considera famílias com renda até R$ 2.640,00. O valor médio das habitações para esta faixa de renda é de R$ 135 mil.
Ieda Vasconcelos, economista da CBIC responsável pelo levantamento, destacou que o volume de recursos anunciado para o MCMV no período de 2023 a 2026, somado às contrapartidas, resulta em R$ 394 bilhões, apresentando um gargalo de mais de R$ 567 bilhões para alcançar o investimento necessário para suprir a escassez atual de moradias.
De acordo com o vice-presidente de Habitação de Interesse Social da CBIC, Clausens Duarte, o estudo reforça a importância para que as autoridades reconheçam que, apesar da situação fiscal desafiadora, os recursos necessários para sanar o déficit também podem ser mobilizados a partir da parceria com a iniciativa privada. Para ele, no entanto, isso requer a melhoria na segurança jurídica, garantindo um ambiente de negócios mais propício para os investimentos. “O desafio de garantir moradia digna é de todos, é do país. E a parceria com a iniciativa privada pode contribuir com os recursos necessários para enfrentarmos esse desafio. Mas é preciso maior segurança empresarial para um ambiente de negócios mais atrativo aos investimentos”, disse.
A CBIC apresentou o impacto na economia do país caso o recurso total necessário para sanar o déficit fosse injetado na produção de novas moradias. Segundo Ieda, o valor aumentaria o PIB da construção em R$ 444 bilhões e elevaria a arrecadação de tributos em mais de R$ 507 bilhões, considerando os efeitos diretos, indiretos e induzidos. Seriam criados mais de 4,4 milhões de novos postos de trabalho na construção e mais de 12,5 milhões de novos empregos na economia, considerando outras atividades impactadas pelo crescimento da construção.
“Sabemos que um aporte único desse montante é pouco provável. Mas nosso intuito é mostrar o forte impacto na economia, que alcançaria um incremento de 10% sobre o PIB”, contou a economista.
De acordo com o presidente da CBIC, investir na construção gera uma retroalimentação na economia, já que o recurso destinado a obras gera emprego, renda para a população e garante moradia, mobilidade e saneamento. Para ele, a construção é a única atividade econômica capaz de agregar a melhoria do ambiente de investimento com a redução da desigualdade social.
“A construção consegue fazer o casamento perfeito da competitividade da economia com a inclusão social. O que nós entregamos não é um recurso que vai e não volta. O efeito de se investir na construção é muito grande, com geração de novos postos de trabalho, mais famílias conquistam sua casa própria e cidadania, melhora a infraestrutura urbana das cidades e garante ao setor produtivo os instrumentos necessários para manter a economia girando. Habitação e infraestrutura reduzem o passivo social e ainda trazem os ganhos pelo aumento dos investimentos. É momento de o poder público priorizar a construção como alavanca para enfrentar e resolver os desafios sociais do Brasil”, disse.
Infraestrutura
O tamanho do déficit de infraestrutura do Brasil também foi apresentado no levantamento da CBIC. A entidade considerou os níveis ideais de investimento estimados pelo Banco Mundial e pela Associação Brasileira da Infraestrutura e Indústria de Base (ABDIB).
Para o Banco Mundial, o investimento ideal em infraestrutura é de 3,7% do PIB do país ou cerca de R$ 403 bilhões. A ABDIB destaca que o recurso para infraestrutura deve chegar a 4,31% do PIB ou quase R$ 470 bilhões. A média de investimento do Brasil, no entanto, foi de 1,96% ou R$ 213 bilhões, em 2023, resultando em um hiato de R$ 197 bilhões em referência ao valor apontado pelo Banco Mundial e de R$ 258 bilhões com o ideal estimado pela ABDIB.
A CBIC apresentou uma projeção de impacto na economia, caso fossem aplicados esses valores complementares na infraestrutura do Brasil por dez anos. O investimento de R$ 197 bilhões ao ano adicionaria R$ 58 bilhões à arrecadação tributária do país e resultaria na criação de 915 mil novos postos de trabalho. Já o investimento de R$ 258 bilhões ao ano pelo mesmo período geraria mais de 1,2 milhão de empregos e adicionaria 1,1% do PIB.
O estudo mostrou que o transporte registra a maior distância entre o ideal de investimentos e o montante aplicado no setor. Para o Banco Mundial, o investimento ideal seria de R$ 213 bilhões em transporte. A ABDIB avalia que o ideal é aplicar R$ 246 bilhões. Contudo, o Brasil aplicou apenas R$ 41 bilhões em 2023.
Os R$ 204 bilhões de investimento em transporte ao ano por dez anos, fruto do hiato referenciado pela ABDIB, resultaria em mais de 952 mil novos postos de trabalho gerados e uma arrecadação adicional de R$ 60 bilhões.
É importante criar condições para diminuir o Custo Brasil, alertou o vice-presidente de Infraestrutura da CBIC, Carlos Eduardo Lima Jorge. “O Novo PAC é um caminho para o desenvolvimento, mas sinaliza a preocupação de que o recurso destinado não será o suficiente para cumprir a meta projetada. O país carece de uma melhor estruturação para melhorar o ambiente de negócios e estimular o investimento privado”, disse.
Taxa de investimento
O estudo apontou a perda de participação da construção na taxa de investimento do país nos últimos anos, mantendo-se inferior à média mundial. De acordo com o levantamento, houve um pico de investimentos em 2013 e um recuo a partir de 2014. Em 2022, a taxa média de aplicação no setor da América Latina e Caribe era de 20,4%. No Brasil, a taxa chegou somente 17,8% de investimento.